Pedagogia da autonomia


Adolescência, família e drogas

“A adolescência é como um segundo parto: o filho nasce da família para entrar na sociedade”                                          
Particularmente acredito muito no poder do conhecimento para a transformação do ser humano, através da auto-educação. Essa palestra sobre adolescência, nas diversas vezes que já tive oportunidade de divulgá-la, em casas espíritas ou escolas, vem acrescentar muito aos pais e educadores em geral, pois lhes traz um conhecimento científico sobre um problema tão conhecido:  o conflito entre adolescentes e pais. Quando os pais assistem a palestra adquirem uma visão diferente sobre a questão e conseqüentemente têm maior compreensão sobre essa fase tão difícil e delicada dos filhos adolescentes, facilitando, assim, o convívio entre eles e dando-lhes maior apoio e segurança. O que constitui um fator de proteção aos filhos adolescentes.
A adolescência não possui uma definição precisa, clara, como temos noção da infância e idade adulta. Em algum ponto a imaturidade da infância e a maturidade da idade adulta  estão os seis ou sete anos que chamamos adolescência. Para o leigo, a adolescência refere-se simplesmente ao processo de crescimento, o período de transição entre a infância e a idade adulta compreendida entre os 13 e 19 anos de idade. Entretanto, o período da adolescência varia de cultura para cultura e vem abrangendo períodos cada vez maiores, podendo se estender até os 22 anos ou mais, idade na qual considera-se que o indivíduo seja capaz de estabelecer sua identidade pessoal. O termo adolescência refere-se aos desenvolvimentos psicológicos que estão relacionados aos processos do crescimento físico, definidos pelo termo puberdade.  (HERBERT, 1991).
Nessa fase, o adolescente apresenta:

contornos da autonomia

processo doloroso em muitos aspectos, gratificante e alegre em outros

período diferente dos outros períodos de desenvolvimento

conserva aspectos infantis e já tem aspectos adultos

A Síndrome da Adolescência Normal (SNA) é um conjunto de “sintomas” característicos da fase da adolescência, que embora se apresente como universal há características bastante peculiares, conforme o ambiente sócio-cultural do indivíduo, não sendo possível estabelecer seu início e término precisos, acreditando-se, todavia, que culmina com o estabelecimento da identidade pessoal.

1. Busca de si mesmo e da identidade

2. A tendência grupal   

3. Necessidade de intelectualizar e fantasiar

4. Crises religiosas       

5. A vivência do tempo

6. A sexualidade

7. Atitude social reivindicatória 

8. Condutas contraditórias

9. Separação progressiva dos pais        

10. Constantes flutuações do humor

 

1. A busca de si mesmo e da identidade consistem em um processo de busca: com encontros fortuitos, com as paixões repentinas, transitoriedade, formulação da auto-imagem, autodefinição corporal e psicológica. O adolescente não é reconhecido neste esforço; o ambiente tende a criticá-lo pela sua volubilidade e culpabilizá-lo.

2. A tendência grupal onde o adolescente busca uma  IDENTIDADE GRUPAL que facilita a resolução das ansiedades em relação à própria falta de referenciais, modismos, posições ideológicas e filosóficas.

3. Necessidade de  intelectualizar e  fantasiar: o raciocínio evolui do concreto para o hipotético dedutivo.     

4. Crises religiosas:  busca de identidade, busca   simultânea de  um  mundo e uma dimensão religiosa que se tornam campo de experimentação e possíveis definições.

5. A vivência do tempo: o adolescente tende a vivenciar o tempo de forma peculiar, diferente; dilatação da dimensão do presente com conseqüente afastamento da dimensão do passado e do futuro; é comum se referir ao passado como algo vivido remotamente e ao futuro como algo longínquo. O adolescente tem a percepção diferente do tempo em relação ao adulto.

6. A sexualidade: pode apresentar variadas tendências; ansiedades podem ser geradas dependendo do ambiente.

7. Atitude social reivindicatória: o adolescente se percebe como parte de uma coletividade, isso o torna capaz de uma ideologia, de uma atitude e de um posicionamento.

8. Condutas contraditórias: experimentação constante; desvios constantes dos objetivos originais.

9. Separação progressiva dos pais: ambivalência dos adolescentes entre situações de dependência e independência. Pais: permissividade e autoritarismo.

10. Constantes flutuações de humor: diante de tantas modificações, conquistas e impedimentos de toda ordem, o adolescente tende a ter polarizações tanto na linha depressiva quanto eufórica. É uma flutuação constante de humor.

Segundo Freitas (2002), o adolescente é extremamente vulnerável aos apelos provenientes do mundo das drogas em virtude das modificações pelas quais passa o seu mundo interno. A fase da adolescência é muito complexa, com ganhos e perdas importantes. A negação desse sofrimento é que se traduz em uma das graves patologias desse período da vida do ser humano. Essa negação, muitas vezes, conduz a comportamentos anti-sociais e autodestrutivos, encobridores de uma intensa angústia existencial.
Se a criança cresce em um ambiente familiar sem amor, sem limites, sem atenção, ela pode tornar-se um indivíduo sem estrutura emocional para enfrentar os mais diversos problemas de sua vida. Quando se torna um adolescente, essa mesma estrutura emocional  frágil aliada às mudanças da adolescência são fatores de risco para que ele vá em busca de um escape. E, se ele relaciona-se com a droga, no próprio ambiente familiar ou social, a progressão para desajustes sociais, que dentre outros pode ser a dependência de drogas, será apenas uma questão de tempo.

A família e o adolescente

A família deve proporcionar autonomia para o jovem e favorecer seus papéis adultos (socialização/individuação) para um desenvolvimento sadio, com autonomia, independência e condições para tomar suas próprias decisões. Há a  necessidade de continência familiar: uma moderação nas suas ansiedades, expectativas, críticas, etc...A flexibilidade é a chave do sucesso: não ser radical, autoritário. A adolescência exige mudanças estruturais e renegociações de papéis, envolvendo,às vezes, duas gerações. Os pais, ao satisfazerem as necessidades de maior apoio e autonomia, podem entrar em contato com necessidades semelhantes neles mesmos. A tensão pode vir de ambos os lados, pais e filhos. Os pais devem aprender a ter um relacionamento adulto com os filhos crescidos. Para os pais é muito difícil deixar de tratar os filhos como crianças. Deixar de tratá-lo como o “nenê da mamãe”, por exemplo. Na maioria das famílias, com filhos  adolescentes, os pais estão com seu foco de atenção em outros pontos (muitas vezes reavaliando casamento e a carreira) e deixam de prestar atenção às necessidades de seus filhos adolescentes. O filho que  reivindica independência pode vir a criticar os pais que a concedem com facilidade. O pendor para a independência é natural, mas a perspectiva de uma independência completa é assustadora. Ele precisa de limites dos pais e ele quer ter esses limites para se sentir parte de um grupo, sentir-se amado e protegido.”Não devemos nos limitar a dar educação às nossas crianças, devemos ensiná-los a ser pessoas.” (Herbert Spencer).   O questionamento dos valores paternos sem qualquer diálogo leva os adolescentes a criticar as falhas dos pais. Nas famílias em que as decisões e a auto-regulação são limitadas, os adolescentes tendem a ficar mais dependentes e menos seguros, cooperando-se, assim para o desenvolvimento de um adulto inseguro e dependente de outras pessoas. A adolescência também constitui uma fase de perda para a família: perde-se a criança para dar lugar ao adulto  jovem.  A filosofia a ser aplicada nesta fase pode ser chamada de “afrouxe e aperte”: dizer “sim” sempre que possível; “não”, quando preciso. Flexibilidade é necessária. O mais importante de tudo é não se afastar emocionalmente do filho.  “Pais podem falar o quanto quiserem, mas só irão ensinar quando praticarem o que pregam”. (Arnold Glasow).

A presença do pai é importante. É difícil para as mães tratar de problemas disciplinares sozinhas. 

Sampaio (1994): A presença dos pais junto ao filho é tão ou mais importante nessa etapa do que na infância, uma vez que seu papel agora é o de estar atento, de mobilizar sem dirigir, de apoiar nos fracassos e incentivar nos êxitos, em suma, estar com eles e respeitar cada vez mais sua individualização. (...) que possa ter capacidade para aceitar o que não pode mudar, coragem para mudar o que é preciso e sabedoria para reconhecer a diferença.

É necessário que os pais, outros familiares, professores e adultos, que convivem diariamente com o adolescente, estejam atentos e dispostos a ajudá-lo a passar de forma construtiva por essa fase do ciclo vital.

Satir (1991): “confiem nos jovens” 

                        * família é contexto natural para crescer                                  

                        * família é complexidade                                                         

                        * família é teia de laços sangüíneos e sobretudo de laços afetivos

                        * família gera amor, gera sofrimento

                                                       

“É na educação dos filhos que se revelam as virtudes dos pais”. (Coelho Neto)

 
Fontes: 
Aula da Dra. Sandra Scivoletto  - psiquiatra Especialista em Psiquiatria da Infância e Adolescência no curso de Aprimoramento em Dependências Químicas pela USP.
 
HERBERT, M. Convivendo com Adolescentes.  Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1991.
 
FREITAS, L.   Adolescência, Família e Drogas – A função paterna e a questão de limites. Rio de Janeiro: Mauad, 2002. 
OSÓRIO, L. C. Adolescente Hoje. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992.